domingo, 13 de junho de 2010

NA REDE PODE

A admiração de todos pelo Padre Chaves só era comparável àquela que os fiéis têm por Padre Cícero. Era um santo homem que abria todas as portas da Salvação. Paciente, caloroso e mais que tudo, muito dado. Beijava todas as paroquianas sem exceção. Apertava as mãos e abraçava os homens. Distribuía sorrisos e brincadeiras com as crianças. Aos domingos, após a missa, era visto na praça da Igreja a passear rodeado por muitos. Cumprimentava os velhos que faziam roda na Farmácia. Soltava indiretas quando passava pelos jogos de dominó. “O jogo é um vício!”, dizia. Nunca voltava para a Casa Paroquial sem levar presentes: um bom vinho, uma galinha gorda, queijos e até velas para a Santa.

O Padre Chaves era modesto. Passava a maior parte do tempo em casa. Notava-se, pela vidraça, que a televisão ficava ligada noite adentro. Era um típico homem de interior. Diziam que só dormia em rede. Era um hábito.

A Casa Paroquial tinha um grande terraço em frente. Ficava ao lado da Igreja e o Padre Chaves às vezes era visto fazendo a sesta, sem se incomodar com os vizinhos que passavam pela calçada. A casa era pequena, mas suficiente para o Padre Chaves e sua prima Lili. Sim, Lili morava com ele já há alguns meses. No começo, houve insinuações e suspeitas, mas todos terminaram aceitando que finalmente o Padre Chaves precisava de uma parenta para cuidar da casa. Lili era esbelta e atraente. Quando ia à feira, não poupava aos homens alguns comentários. Mas tudo parava por aí. Ela era uma mulher séria e que comungava todos os dias. Depois, com a ajuda de algumas beatas, arrumava a Igreja até a hora de fechá-la. Assim era a rotina. Às vezes, criticavam até que, ela sozinha, mantinha a Casa Paroquial enquanto o Padre Chaves dormia em sua rede.

Certa manhã, uma multidão começou a se formar diante da Igreja. As mulheres rezando o terço. Os homens gritando pelo Padre Chaves. Nunca houve tamanha algazarra. Todos estavam revoltados com a atitude do Padre. É que ele, agora, resolvera não mais dormir em rede e acabara de receber uma cama de casal.

Conto de Lucilo Varejão Neto

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