Macapá , 29-08-81
Por OLIMPIO BONALD NETO
Em Abril de 1980 o então Min. da Industria, João Camilo e o Presidente da EMBRATUR, Miguel Colassuonno corriam o Mundo anunciando aos Agentes do Turismo Internacional as perspectivas do Turismo Brasileiro com seus Destinos, Atrativos exóticos e novos Equipamentos no Norte e Nordeste.
Entre os amazonenses crescia a expectativa de assistir o desembarque de levas de visitantes estrangeiros a cata dos derradeiros índios vivendo na legendária floresta virgem, com seus rios, natureza tropical, igarapés, aves e animais selvagens.
No ano seguinte nossos amigos e ex–alunos, turismólogos, Flávio Zirpolli e Marta Figeiredoi, que estavam no interior amazonense aplicando seus conhecimentos científicos na Secretaria de Turismo do Território do Amapá, convidaram-nos a visitar a sua área de atuação e aconselhar, especialmente no que respeitava à programação dos eventos e marketing, o produto turístico amapaense a ser lançado no mercado interno e internacional.
Das paginas das notas daquela viagem em companhia de Zenaide e dos amigos Zirpolli , extraímos trechos mais curiosos .
AVENTURA E VIAGEM
Uma experiência inesquecível !
Andamos de avião, de barcos , de carros e canoas centenas de quilômetros pela região mais desconhecida e de menor densidade populacional do Brasil que vinha tendo o maior crescimento, entre as décadas de 71 e 81, igual a 5% ao ano e superior ao dobro da media nacional. Uma imensa terra úmida e quente (média de 25º C), de chuvas diárias e abundantes que chegavam a 2 mil mm anuais, dominada pela magnífica e lendária floresta virgem com todo seu mistério.
Visitamos pitorescas vilas, aldeias e desde tabas bem primitivas até modernas empreendimentos capitalistas como as áreas de extração de minério manganês, explorada por norte americanos .
Ali fotografamos ( discretamente) o desperdício de nossas reservas naturais, com o corte de arvores centenárias e a queima dos miolos de madeiras nobres em grandes fogueiras que ardiam nos pátios das madeireiras internacionais, depois que exploravam as matas e serravam milhares de barrotes e tabuas ao longo da Ferrovia particular. E tudo, generosamente, dado em concessão de 50 anos às Empresas internacionais de mineração.
Nessa ocasião fizemos uma das mais fascinantes excursões pelo interior da selva, atravessando igarapés e trilhas para visitar a cidade sede da Empresa ICOMI, na vila da Serra Negra. Ali estavam as minas de manganês, exploradas a céu aberto e a FÁBRICA DE BENEFICIAMENTO, onde o minério bruto era PELOTIZADO, para serem embarcadas nos vagões e levadas , na extensa ferrovia (de mais de 200 kms) até ao Porto de Macapá onde seguiam para o exterior. Naquela ocasião nos disseram que os americanos estavam levando todo o minério arrancado da terra amazônica para uma área desértica do Arizona onde enterravam como “reservas técnicas” para a fabricação de aço no futuro...
Hospedados na Vila, observamos tambem como o material de construção, moveis, utensílios, maquinas , veículos, muitos alimentos enlatados e até os descartáveis vinham dos EE UU, assim como a maior parte dos trabalhadores especializados e administradores.
NA VILA DA ICOMI – alto da SERRA NEGRA
“- Aqui não há dia feriado, nem dia santo ou domingo”, disse-nos o guia ; “todas as horas, do dia e da noite são de trabalho para a gente que se reveza nas maquinas e nos veículos.
É colossal o esforço dos miúdos homens destruindo sistematicamente a vegetação das colinas para arrancar de suas entranhas o manganês, minerio raro e tão cobiçado pela Industria internacional do aço.
Começa com a derrubada, desde os arbustos às majestosa arvores centenárias, algumas altíssimas.
Depois os tratores “descascam” a cobertura viva do húmus e a vegetação rasteira, rasgando sulcos largos e cada vez mais profundos até encontrarem os veios do minério que existem, às vezes a poucos centímetros da superfície e, em outras partes, alcançando até 8 ou12 metros abaixo da superfície, formando verdadeiros desfiladeiros.
Todo o trabalho é feito, a “céu aberto”.As enormes escavadeiras - como paleolíticas feras de aço e pneus vão arrancando nacos da terra virgem e ruminando as rações para cuspirem nas caminhões-caçambas o negro e brilhante manganês em forma bruta, com outros minerais ainda mais raros, como bauxita, mica, ferro e as vezes até pepitas de pedras e metais preciosos, cobre, prata e ouro sendo tudo pulverizado e transformadas em pequenas bolas negras, rebrilhantes.
Uma tarde saímos, com o Sr. Edson, Chefe de Segurança e RP da ICOMI na Vila, num tour pelas minas para ver as dependências do empreendimento. Havia cerca de 10 minas espalhadas em vários pontos da floresta, ao redor da Vila, trabalhando para alimentar a planta industrial de beneficiamento do minério que produziam muitas toneladas por dia. O minério pelotizado era armazenado em silos ou, no pátio ao ar livre, em enormes dunas negras para embarque pela ferrovia até o Porto de Macapá, distante 200 km.
Numa dessas excursões, viajando numa camionete Rural , assistimos a um dos mais temíveis e belos espetáculos da Natureza.
UMA TEMPESTADE TROPICAL NA FLORESTA AMAZÔNICA
Ao pararmos no mirante de uma profunda mina avistamos, por cima do verde escuro da floresta, a nuvem opaca crescendo no horizonte , aos nosso pés e manchando o céu de azul translúcido,
-“Vem chuva grossa “.Disse o guia. –“Vamos embora!”
Uns quinze minutos depois, quando já atravessávamos uma clareira, cercados por gigantescas arvores de 10 a 15 metros, começou a chuva.
Ela foi anunciada por rajadas de vento sibilando na folhagem e e derrubando muitas folhas, pequenos frutos e galhos . A ventania aumentou instantaneamente como se houvessem ligado milhares de gigantescos ventiladores.
Tal se a Natureza entrasse em convulsões de crise epilética com ventos e os estrondos dos trovões ecoando na imensidão, tremendo a terra e fazendo coro às golfadas de água, jogadas das nuvens negras que pareciam ter baixado à altura das copas mais altas, tudo encobrIndo, não se vendo mais nem o céu, nem galhos, nem claridade entre as folhagens.
Ainda hoje , como num flash , vejo aquela tarde que se fez escura noite de cortantes ventos gelados rugindo entre as arvores açoitadas pela tempestade. Não foram pingos mas pedaços de água gelada que cairam e doeram em nossas mãos estendidas fora do veiculo. Grossa chuva que furava o chão areia e batucava no teto da Kombi como em um enorme tambor , dificultando até a comunicação verbal.
Continua vivo o espanto e o medo estampados em nossas faces quando uma das arvores mais isolada , espancada pelas chicotadas da ventania e do aguaceiro gelado, com os galhos enlouquecidos querendo largarem-se dos troncos e fugirem da tortura, foi atingida por um fulgurante relâmpago.
Vergando-se toda, como se pressionada por uma terrível mão invisível, torceu-se e quebrouo tronco logo abaixo da copa. A enorme criatura ferida de morte, tombou, rodopiando a frente do nosso veiculo , como se gritasse espichando e retorcendo os ramos mais delgados - dedos finos- , a soltarem cabelos verdes, folhas, ninhos e ramagens inteiras.
Todos
Na mesma hora recordei, a espetacular descrição de tempestade semelhante feita por Euclides da Cunha NA AMAZONIA MISTERIOSA durante suas viagens pelo Alto Purus.
Sem o talento euclidiano , todavia, mas sem poder esquecer a cena fantástica desde então venho tentando fixar em prosa aquela poderosa e inesquecível emoção multi-sensorial .
Agora, tantos anos passados, sei que jamais esquecerei aqueles poucos minutos de vida fragílima no meio da fúria dos elementos naturais explodindo dentro do coração selvagem e bárbaro da floresta amazônica.
Atenção: consertar e prosseguir - tarde 29-6-09
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